A ANM e os desafios da regulação mineral no país
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A ANM e os desafios da regulação mineral no país
Agência enfrenta desafios como a defasagem da carreira e a defesa ao meio-ambiente
Criada em 2017, a Agência Nacional de Mineração (ANM) já enfrentou desafios importantes como o grave rompimento da barragem em Brumadinho (MG) e a recente questão do garimpo em Roraima. A “caçula” das agências reguladoras federais no Brasil atua no âmbito da exploração e gestão de recursos minerais pertencentes à União.
É vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com sede e foro em Brasília (DF) e circunscrição em todo o território nacional. Sua competência é regular, outorgar e fiscalizar o setor mineral, incluindo campos como a pesquisa mineral; a água mineral; os garimpos; os fósseis; a extração de materiais para construção civil; a lavra de substâncias; e a exploração de diamantes.
Assim como as demais agências reguladoras federais, a autarquia opera no equilíbrio dos interesses envolvidos nas atividades econômicas do país, mediando as relações entre o poder público, os agentes privados prestadores de serviço e a sociedade. Sua função está ligada diretamente na regulação promovida pelo Estado no setor, uma vez que a mineração é um recurso essencial e estratégico para a economia no Brasil.
Conforme descrito no site da agência, seus valores são “ser agente na transformação do setor mineral para o desenvolvimento econômico e social do país, atuando de forma integrada, ética e colaborativa”, e sua missão “promover o acesso e o uso racional dos recursos minerais, gerando riquezas e bem-estar para a sociedade”.
Mineração – A exploração mineral se confunde com a história do Brasil e a criação e desenvolvimento de importantes cidades brasileiras. O período do famoso ciclo do ouro, por exemplo, destaca uma época em que a extração e a exportação do minério foram as principais fontes econômicas do Brasil colônia e da metrópole, Portugal, no séc. XVIII, com a exploração concentrada em Minas Gerais (MG), Goiás (GO) e Mato Grosso (MT).
“Ainda hoje, o setor representa uma significativa parte da produção nacional e das exportações, sendo o responsável por 4% do PIB e por 80% do saldo da balança comercial brasileira”, destaca o presidente da UnaReg, Elson Silva.
Em 2021, a produção desta área foi estimada em 339 bilhões de reais. A lista de setores que dependem da utilização de minerais é extensa, perpassando a cadeia de fabricação das indústrias de aço, ferro, fármacos e eletrônicos, a construção civil, a geração de energia elétrica e o setor de transportes, por exemplo. Além disso, são considerados recursos não-renováveis, ou seja, finitos, o que pede extrema responsabilidade e estratégia em seus processos de extração e comercialização.
Diante da complexidade e da importância dos minerais, a própria Constituição Federal de 1988 (CF/88) reforçou que as propriedades destes recursos no país pertencem à União (art. 20, IX), cabendo a ela administrá-los, garantindo-se o regime de concessão e autorização da União para a pesquisa e lavra dos recursos minerais, segundo o interesse nacional, por brasileiros ou empresas constituídas sob as leis brasileiras, que tenham sua sede e administração no país (art. 176, caput e §1º da CF/88).
Dessa forma, cabe também a ANM implementar as políticas nacionais para o setor de mineração, abrangendo a normatização técnica, a fiscalização do aproveitamento dos recursos minerais do país além da gestão destas informações.
Proteção ao meio-ambiente – A atuação da agência se destaca, ainda, no alinhamento do entendimento da Constituição Federal e da legislação ambiental em relação às perspectivas socioeconômicas e ambientais nas práticas de extração. A Constituição Federal orienta, por exemplo, no artigo 225, a necessidade de recuperação do meio ambiente degradado por aquele que houver explorado os recursos minerais.
“A autarquia desempenha um papel mediador fundamental no cumprimento e fiscalização da constituição e da legislação ambiental, bem como nos estudos e controle do impacto ambiental nas diversas práticas de mineração”, ressalta Elson Silva.
Na década passada, acompanhamos, estarrecidos, os gravíssimos acidentes ambientais ocorridos em Minas Gerais, nas cidades de Mariana (2014) e Brumadinho (2019), causados pelo rompimento das barragens de rejeitos da mineração. Recentemente, a situação preocupante do garimpo ilegal em Roraima e suas consequências devastadoras para o meio-ambiente e os indígenas da terra Yanomami.
Neste sentido, a articulação da ANM junto aos órgãos de defesa do meio ambiente é crucial para a proteção e preservação ambiental, uma vez que os impactos causados pela atividade mineradora podem ser destrutivos para a natureza e a população. Porém, como já denunciou a UnaReg, a agência enfrenta o sucateamento e a falta de recursos humanos, o que pode afetar a qualidade de seus serviços.
“Em Roraima, por exemplo, no enfretamento ao trágico cenário dos Yanomamis, a ANM contava com apenas duas equipes, sendo quatro fiscais, incluindo o gerente regional. Esses servidores acumulam as funções de fiscalizar, fazer a outorga, atender ao público, responder aos pedidos do Ministério Público Federal, Tribunal de Contas da União, Advocacia Geral da União e Polícia Federal, além de administrar a unidade”, alerta o presidente da UnaReg.
Desestruturação da carreira – A ANM sofre hoje com defasagem remuneratória de 46% em relação às demais agências reguladoras, além da evasão de servidores. Em 2010, por exemplo, havia 1196 vagas ocupadas e hoje são apenas 664, uma redução de 44,48% entre 2010 e 2022. Dentre os fatores que explicam essa evasão está a saída dos servidores por conta dos baixos salários.
Cabe, ainda, ressaltar que, em 2020, foi aprovado concurso para 40 vagas de técnicos de segurança de barragens para atuação exclusivamente nessa área. Somente 22 foram aprovados e hoje restam apenas 12 após os diversos pedidos de exoneração. Considerando o insucesso, foi aprovado novo concurso realizado em 2022.
A recente aprovação da admissão desses novos 40 novos servidores pelo Ministério da Gestão deveu-se ao termo de acordo firmado na Ação Judicial 1005310-84.2019.4.01.3800, após o acidente em Brumadinho, que tem como signatários a ANM, a União e o Ministério Público Federal (MPF). As vagas novamente foram destinadas apenas para atuação na segurança de barragens, não resolvendo o déficit em todas as outras áreas de atuação da ANM.
O cadastro de reserva previsto no edital, não foi totalmente preenchido e possivelmente será esgotado antes da validade expirar, reflexo de que a remuneração atual oferecida não atrai profissionais técnicos como Engenheiro e Geólogos. Junte-se a isso, o acúmulo de atividades.
A ANM, conforme prevê a Lei Geral das Agências Reguladoras, possui natureza especial, ou seja, a legislação lhe garante autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira. Além das atividades já citadas no texto, segundo a lei de criação da ANM (nº 13.575/2017), a autarquia pode “realizar vistorias, notificar, autuar infratores, adotar medidas acautelatórias como de interdição e paralisação, impor as sanções cabíveis, firmar termo de ajustamento de conduta, constituir e cobrar os créditos delas decorrentes, bem como comunicar aos órgãos competentes a eventual ocorrência de infração, quando for o caso” (art. 2º, XI).
“Ou seja, um vasto escopo de atuação e responsabilidade que justifica a urgente reestruturação de uma agência tão estratégica para o Brasil em meio à conjuntura que envolve os interesses econômicos do país e, principalmente, a proteção do meio ambiente, dos povos originários e da sociedade”, defende Elson Silva.
Especial Agências – Esta é uma série de matérias realizada pela UnaReg com o objetivo de informar e apresentar ao público geral, de forma simples, sobre a atuação e a importância das agências reguladoras federais no Brasil. Acompanhe as próximas matérias em nossas redes! Compartilhe o trabalho das agências!